Ao longo do mês de Maio de 2015, organizou-se o 1º ciclo de Encontros com Críticos de Arte, decorridas às segundas no Auditório Lagoa Henriques da FBAUL. Sucedidas no âmbito do Mestrado de Crítica, Curadoria e Teorias de Arte, e de linhas de trabalho do CIEBA-secção Francisco d’Holanda, o evento teve o envolvimento da revista Convocarte, a partir da sua proximidade com linhas de investigação sobre a historiografia, a crítica e a teoria estética em Portugal, cujos contributos são patentes na segunda pasta de ensaios desta edição. O evento pretende deixar alguns contributos que compensem a carência de estudos relativos aos discursos sobre arte em Portugal, sobretudo no caso da crítica de arte em Portugal. Sendo um trabalho da Área de Ciências da Arte e do Património, teve a organização dos Professores Cristina Tavares e Fernando Rosa Dias.
Este ano, os encontros fizeram uma homenagem a Rui Mário Gonçalves, um dos mais destacados críticos de arte portuguesa da segunda metade do século XX, que nos abandonara cerca de um ano antes, em Maio de 2014. Para os próximos encontros prepara-se uma sessão especial mais alargada sobre Rui Mário Gonçalves, abordando a sua importância em diferentes facetas, tais como crítico de arte, historiador de arte ou curador.
Os problemas actuais do exercício da crítica de arte, tal como as suas relações com a prática curatorial, ou as suas contribuições para a teoria e história da arte, foram aspectos colocados em debate e reflexão. Com cerca de 2 horas, as sessões decorreram não propriamente como uma conferência nem como um aula, mas como depoimentos pessoais, desenvolvidos em tom de conversa com os moderadores e com os interessados presentes. Apesar do desenvolvimento livre, as sessões decorreram com a seguinte preocupação estrutural, mais ou menos pela mesma ordem:
- Uma breve apresentação biográfica inicial de cada crítico convidado, por vezes desenvolvida pelo próprio.
- Uma direcção sobre histórias e memórias pessoais da actividade de crítico de arte
- Tentar definir e problematizar, a partir da experiência pessoal, a actividade de crítico de arte
- Discutir a situação actual da actividade de crítico de arte.
- Em todos estes parâmetros interessa possíveis relações com a experiência da curadoria, da história ou das teorias da arte, seja algum contributo pessoal, seja algum posicionamento pessoal.
- No caso deste ano de 2015, houve ainda a preocupação de apresentar testemunhos pessoas relativos a Rui Mário Gonçalves.
As sessões decorreram com os seguintes convidados:
- José-Augusto França – 4 Maio 2015
- Sandra Vieira Jürgens – 11 Maio 2015
- José-Luís Porfírio –18 Maio 2015
- Sílvia Chicó – 25 Maio 2015
Os convidados abarcavam assim, geracionalmente, um tempo vasto de percurso da crítica de arte em Portugal. José-Augusto França, actuante desde a década de 1940, é uma figura incontornável da crítica e história da arte em Portugal, tendo feito a primeira grande sistematização da história de Arte Portuguesa da Era Contemporânea, tornou-se parte essencial dela. A cumplicidade com Rui Mário Gonçalves, os esforços de profissionalização da crítica de arte, com a reforma da secção Portuguesa da AICA em finais dos anos 60, tal como reflexões sobre o que é a actividade, foram alguns dos motes da sua intervenção. José Luís Porfírio, com carreira no âmbito museográfico, tendo sido director durante vários anos do Museu de Arte Antiga, apresentou o seu diálogo com a prática crítica, que tem exercido regularmente desde os anos 60, transportando essa experiência de décadas, desde tempos dinâmicos da actividade até à sua derrisão actual. Sandra Vieira Jürgens, representando gerações mais recentes, apresentou envolvimentos da crítica com a curadoria e o uso de plataformas digitais para as quais se tem deslocado a crítica de arte, abrindo espaços de discussão sobre a actividade nestes novos suportes. Sílvia Chicó iniciou a sua apresentação com reflexões sobre a vasta actividade de Rui Mário Gonçalves, tendo numa segunda parte, apresentado o seu percurso pessoal, enquanto crítica, professora e curadora, com atenção ao lugar do feminino nestas áreas.
As sessões videogravadas podem ser vistas em:
- 11 de maio – https://educast.fccn.pt/vod/clips/1680fq51w7/link_box
- 18 de maio – https://educast.fccn.pt/vod/clips/1ojgjnzd3g/link_box
- 25 de maio – https://educast.fccn.pt/vod/clips/2khzgjmdri/link_box
Rui Mário Gonçalves (1934-2014) licenciou-se em Química pela Faculdade de Ciências. Enquanto estudante organizou exposições de arte moderna e debates no espaço Universitário (Retrospectiva da Pintura Não Figurativa em Portugal, Março 1958,F. Ciências), a que se seguiu a concepção de textos críticos sobre arte, desenvolvendo uma actividade que se tornaria cada vez mais intensa ao longo dos anos de 1960 e que, a partir de 1968, se tornaria regular na recente série do jornal A Capital. Graças ao Prémio de Crítica de Arte atribuído pela FCG, entre 1963 e 1964 efectuou estágio em Paris com Pierre Francastel e Jean Cassou. O seu regresso iria afirmá-lo como um dos mais activos críticos de arte de finais dessa década e ainda da seguinte. Pouco depois de regressar dirigiu a galeria Buchholz dando especial atenção à arte moderna e articulando tanto um olhar histórico como contemporâneo, naquela que seria uma das suas principais orientações: «Assim, quando penso no panorama actual das artes plásticas em Portugal, sou tentado a juntar os melhores artistas de hoje como do passado».
Ao longo dos anos de 1980, efectuou ensaios de carácter histórico em torno das artes plásticas portuguesas do século XX que integravam as primeiras sistematizações sobre as décadas de 1960 e 1970, nas artes plásticas. Teve ainda colaborações regulares no Jornal de Letras e Artes (desde 1961 e até 1963, altura em que partiu para Paris, tendo ainda colaborado já no formato revista em 1968), suplemento Pintura & Não (1969-1970), Colóquio Artes (desde 1971), Expresso (desde 1975), ou Artes Plásticas do Porto.
Rui Mário Gonçalves desenvolveu uma intensa actividade pedagógica: Curso de Formação Artística (1967), Conservatório Nacional( 1972),(1974) .Departamento de Românicas da Fac. de letras da Univ. de Lisboa, tendo-se jubilado como Professor Catedrático.
Defensor da educação pela arte participou na equipa de investigação que trabalhou no CAM/FCG de que resultou a publicação “Primeiro Olhar”(2003).
Bibliografia de Rui Mário Gonçalves (selecção):
- «Aspectos da Arte Moderna em Portugal», in História da Arte. Vol.10 (direcção de J. Pijoan), Lisboa: Publicações Alfa, 1979 .
- Pintura e escultura em Portugal — 1940-1980, Lisboa: Instituto de Cultura e Língua Portuguesa, 1980.
- António Dacosta, Lisboa: Imprensa Nacional, Casa da Moeda, 1984.
- «Artes Plásticas», in 10 anos de artes plásticas e arquitectura em Portugal 1974-1984 (com Francisco da Silva Dias), Lisboa: Editorial Caminho, 1985
- «Pioneiros da Modernidade», in História da Arte em Portugal. Volume 12, Lisboa: Publicações Alfa, 1986.
- «De 1945 à actualidade», in História da Arte em Portugal. Volume 13, Lisboa: Publicações Alfa, 1986.
- 100 Pintores Portugueses do Século XX, Lisboa: Publicações Alfa, 1986.
- A Arte Portuguesa do Século XX, Lisboa: Temas e Debates, 1998 .
- Vontade de Mudança. Cinco décadas de artes plásticas, Lisboa: Editorial Caminho, 2004.