Hein Semke. Um Alemão em Lisboa

Exposição “Hein Semke. Um Alemão em Lisboa” – CAM – Fundação Calouste Gulbenkian – Curadoria: Ana Vasconcelos – de 20 de Novembro de 2015 a 13 de Junho 2016

por Inês Fonseca

Hein Semke

 

Hein Semke, artista plástico hamburguês nascido a Junho de 1899, foi voluntário na Primeira Guerra Mundial em 1916. Sendo desmobilizado em 1919 trabalha em diversas áreas e envolve-se em revoltas anarquistas, o que o leva a ser condenado a seis anos de prisão solitária. Em 1929 chega a Lisboa onde trabalha numa fábrica de tecidos em Chelas. Contudo devido a problemas pulmonares, é forçado a regressar à Alemanha, sendo declarado inválido para trabalhos que envolvessem esforço físico elevado. É nesta sequência que decide, também por encorajamento dos seus amigos, estudar artes, dedicando-se exclusivamente à actividade até ao final da sua vida. É em 1932 que se instala em Portugal com a sua primeira mulher, Martha Ziegler. A sua casa em Linda-a-Pastora, local onde se fixa, é “um ponto de convívio de artistas e escritores” até 1949. Relacionava-se e convivia no círculo de intelectuais e artistas lisboetas como Fernando Pessoa, Mário Eloy, Vieira da Silva, Diogo de Macedo ou Jorge Barradas.

Em 1933 expõe as suas obras com os modernistas portugueses. Os críticos Portugueses consideraram o seu trabalho como “ duro e místico, ainda com algumas reminiscências românico-góticas, revelando influência do Expressionismo de Barlach”.

Podemos dizer que o seu entusiasmo político foi deixado para trás, dando agora espaço à “criação estética”, fortemente “caraterizada por um auto-conhecimento”. Esta é a sua primeira fase no seu percurso de artista.

Hein Semke, tornando-se um “pacifista convicto” depois da sua experiência na Grande Guerra, realiza uma obra que ficaria sempre associada a uma controvérsia, e até mesmo a uma “arte degenerada” segundo a opinião da censura nazi. Falamos do Tríptico escultórico criado para o Pátio de Honra dos luso-alemães mortos na Guerra de 1914-18, na Igreja Evangélica Alemã de Lisboa (situada na Avenida Columbano Bordalo Pinheiro). “A Dor”, uma das obras-primas do artista, não apenas pela sua dimensão artística, mas também pela forte componente critica, não agradou a crítica alemã visto colocar uma forte acentuação nos vencidos e no aspecto da derrota.

 

Para Hein Semke, “a guerra e a instituição militar desumanas aniquilaram deliberadamente a humanidade… o soldado e a guerra são monstros.” Claramente percebemos que a sua participação na guerra foi uma experiência traumática que deixou vestígios na forma como encarava a sua vida no pós-guerra.

Já no ano de 1941 as medidas de protecção aos artistas nacionais trouxeram dificuldades económicas ao artista, sempre visto como estrangeirado obrigando-o, cada vez mais, a realizar trabalhos em cerâmica para conseguir sobreviver. Hein Semke tinha suspendido a escultura em favor da cerâmica, realizando em 1947 a sua primeira exposição individual na galeria do SNI. As peças aqui exibidas eram essencialmente escultóricas, sendo-lhes aplicada a técnica do “fogo-aberto”. A renovação desta arte decorativa por Hein Semke é um dos principais factores da renovação da cerâmica portuguesa nesta época, consagrando assim a segunda fase artística do autor.

A terceira fase do seu trabalho centra-se na pesquisa por outros meios de expressão da sua arte. A monotipia, a pintura sobre madeira talhada, a xilogravura, a aguarela e novamente o retorno à escultura.

Portugal, e em específico Portimão, foi uma das grandes inspirações do artista para as suas criações. Permanecendo largas temporadas na Praia da Rocha, Hein observava a fauna e a flora, bem como actividades piscatórias. Estes elementos estão patentes em variadas esculturas e trabalhos literários. As “grandes massas geológicas das paisagens insulares da Noruega também serviram de inspiração para uma série de pequenas esculturas em bronze”. Estes trabalhos apelidam-se de “estudos para grandes formas”.

A obra e vida de Hein Semke já tinha sido celebrada pela Fundação Gulbenkian em 1972 com a exposição “Hein Semke, 40 anos de actividade em Portugal”, bem como uma exposição do seu contributo para a cerâmica portuguesa, presente no Museu Nacional do Azulejo no ano de 1991.

A exposição que agora pode ser vista no CAM na Fundação Calouste Gulbenkian acontece para assinar o 20º aniversário da sua morte e também pela doação por parte da mulher de Hein Semke, Teresa Balté, de um conjunto de mais de mil obras e ainda arquivos e bibliotecas pessoais.